Resenha bibliográfica - A família na Amazônia: desafios para a Assistência Social

1 comment

Maciel, C. A família na Amazônia: desafios para aAssistência Social. Revista Serviço Social &Sociedade nº 71. São Paulo: Cortez, 2002.

O texto, é de autoria do professor Carlos Alberto Batista Maciel, Assistente Social, doutor em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - UNESP/Araraquara. Professor Associado da Universidade Federal do Pará. Diretor Geral do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas - ICSA/UFPA, mandato 2014/2018. Publica artigos em periódicos especializados, capítulos de livros e trabalhos em anais de eventos. Possui 6 livros publicados como autor e co-autor. Orienta: tese de doutorado, dissertação de mestrado, monografia de especialização e trabalho de conclusão de curso. Atua nas áreas de Políticas Públicas e Políticas Sociais.
A proposta levantada pelo autor vem a ser destacar e sugerir alguns elementos para a discussão da família na contemporaneidade, lançando um olhar, particular à região Norte. Desse modo, para dar fundamentação às ideias propostas por ele, o texto organizou-se inicialmente com uma reflexão sobre a relevância social da instituição familiar, em seguida destacou alguns aspectos com informações sobre aspectos da Amazônia. Dando continuidade foram apresentados dados sobre as famílias na Região Norte e por último enfocamos a política de assistência social e a família na Amazônia.

A Instituição Família: relevância real ou fictícia?

O autor utilizando como aporte teórico inicial Carvalho (1994) nos aponta a relevância da instituição família como enfoque das políticas públicas, e que a visibilidade dada a ela exige a busca por opções que possibilitem um alcance coletivo e eficaz na proteção dos indivíduos.
Segundo o autor essa instituição social apresenta-se como complexa, devido suas as diferentes configurações, dessa maneira, ressalta-se a importância da ampliação das discussões e problematizações acerca das temáticas inerentes a ela; e para contemplar essa necessidade, exige-se o auxílio de ferramentas de outras ciências com o intuito de possibilitar um raciocínio que atenda as diversas facetas desse objeto de estudo, destacando sua relevância ou não, a fim de elaborar e organizar as políticas públicas de maneira coerente, em especial, a política de assistência social.
Assim, parte-se da compreensão de que família independente de sua configuração se constitui como primeiro canal de contato de iniciação e aprendizado que os indivíduos têm para acessar um conjunto de normais, regras e relações sociais de uma determinada sociedade, dessa maneira, desenvolvemos nossas primeiras experiências como integrante da sociedade em geral.
Segundo Maciel, utilizando as ideias de Benjamim (1989) explana que certos conteúdos que acessamos para a construção de nossa própria identidade individual e coletiva partem de um passado individual que relaciona-se a um passado coletivo, ou seja, a partir desses mecanismos temos condições de desenvolver a sociabilidade da qual possuímos predisposição, para que assim, em uma lógica, não necessariamente linear, ao longo de ciclos e/ou estágios de nossas vidas possamos compreender a dinâmica que nos rodeia.
Assim, a família como um núcleo estruturado em suas mais diversas configurações deve ser percebida como um movimento que traz em si contradições desencadeadas pelas relações contraditórias que existem em seu interior, que são desenhadas em decorrência das particularidades de cada membro que a compõe e de como este conjunto relaciona-se diante de outras instituições sociais.
Nessa linha de raciocínio, o autor nos coloca que a relação estabelecida entre a realidade que circunda o indivíduo e suas experiências emocionais adquiridas inicialmente no seio familiar, desencadeiam um processo de socialização primaria que, por sua vez, reflete na construção da identidade social do indivíduo. Sob essa perspectiva, o processo de socialização primária sempre estará presente tanto nas relações individuo- família e posteriormente individuo-sociedade.
Diante disso, o autor parte para uma análise de família enquanto unidade geradora de renda e, também, de consumo. Ele nos destaca que as famílias pobres se mostram conforme o pensamento de Draibe (1994) espaços de “maximização dos recursos de todos os seus membros”, ponderando que ao conhecermos a variedade de formas adotadas pelas famílias para a sua sobrevivência, ampliamos nossa visão referente às relações cotidianas que sustentam a vida e a sobrevivência das mesmas, em especial, as mais empobrecidas.
No que tange as relações cotidianas presentes na realidade social das famílias empobrecidas, estas são desconsideradas na formulação e constituição das políticas públicas, especialmente no tocante as particularidades regionais que desenham características socioculturais, econômicas e políticas específicas a partir da processualidade histórica em que as famílias estão mergulhadas.
Amazônia: breve caracterização

Nesse tópico o autor nos apresenta os conceitos atribuídos a Amazônia, e, demonstra que em sua maioria tais conceituações partem de que não dão conta dos aspectos que compõe essa região, gerando por vezes estereótipos idealizados a partir de referências abstratas, como o de "Celeiro do Mundo", "Muro Verde", "Grande Vazio", "Pulmão do Mundo" e etc. Estas denominações caricatas reforçavam a justificativa ideológica de que a região possuía problemas tão imensos que os moradores dela eram incapazes de soluciona-los.
Essa afirmação fundamentou posteriormente a intervenção estatal que assegurava- se na justificativa ideológica que fundamentou a sua ação autoritária na região, em especial nestas últimas quatro décadas.
 Nessa linha de debate, para o professor Maciel, existe a necessidade de povoamento da Amazônia tanto de pessoas, interesses econômicos, políticos e ideológicos, e que ainda não atingimos uma definição concreta que atenda a verdadeira realidade da região, pois, busca- se avançar as discussões e debates sobre a região com a finalidade de ampliar o ponto de vista que aborda apenas questões naturais, mas, que também, incluí aspectos históricos, como uma confluência das ações objetivas do homem social sobre ela nos diversos momentos de sua construção. Para ele, pensar a Amazônia apenas pelo viés de questões naturais é idealizar uma região e limitar conhecer as potencialidades e limitações desse objeto de estudo, inviabilizando que sejam realizadas na região ações planejadas que tenha a substância da realidade concreta em sua fundamentação e da legitimidade social daqueles que a constroem.
Assim, destacou- se a questão da ocupação e exploração descontrolada e sua influencia no intenso processo de migratório ocorrido ali, em particular em alguns polos e cidades, como no caso das capitais dos estados, nas regiões chamadas de "províncias minerais" e nas cidades de implantação dos grandes projetos, como Porto Velho, Itaituba, Carajás, Tucuruí, Serra Pelada e outros, que, ao mesmo tempo, não acompanhou o desenvolvimento econômico, político, social e administrativo dessas localidades, mas fizeram com que algumas cidades crescessem vertiginosamente em alguns anos, de tal forma que multiplicaram várias vezes sua população primária. Então, como consequência direta do inchaço populacional, estas cidades não se encontravam preparadas para enfrentar os reflexos sociais desse fenômeno, principalmente no que tange ao aumento das demandas aos serviços públicos.
Para o professor Maciel, o viver da sociedade capitalista que se impõe como verdadeiro e natural, diminuindo e massacrando as formas diferentes de viver, corroem e destroem a história e a identidade do povo amazônida. Sem uma constituição de um perfil indenitário um povo perde as suas raízes, perde a sua história, fica à mercê das imposições que o estabelecido hegemonicamente delega para ele. Desta forma, o processo de ocupação e exploração da Amazônia, necessita de uma abordagem que contemple para além das dimensões econômicas em sua totalidade, deve levar em consideração suas singularidades, articulando aos processos gerais de ocupação e exploração nos quais a mesma ficou sujeita em seu processo de desenvolvimento.
A família na Amazônia
A partir da reflexão da importância da relevância do estudo da família enquanto instituição social historicamente constituída, a contextualização da região Amazônica onde são identificados pelo autor alguns problemas conjunturais, dá- se prosseguimento no olhar da família nesse cenário que vem a ser o que o texto propõe- se a discutir. Ele observa que a ausência de dados estatísticos consistentes influencia em um mapeamento que dê visibilidade a multiplicidade de informações a respeito das famílias amazônidas.
Traça em seu debate, aspectos relacionados à urbanização em nível nacional onde demonstra um quantitativo de concentrações urbanas por regiões, no caso, a Região Norte tem a menor concentração do território nacional, na ordem de 62,4% da população situada nas cidades. Destaca também, os dados referentes ao rendimento mensal familiar e seus impactos na sobrevivência dessas famílias.

A política de assistência social e a família amazônida

Nesse momento, o autor, por meio da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (1993) nos reitera a existência da base legal que prevê a proteção à família, a maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, e compreende também que a “assistência social realiza-se de forma integrada às políticas setoriais, elegendo a família como foco de sua atenção, visando ao enfrentamento da pobreza, à garantia dos mínimos sociais, ao provimento de condições para atender contingências sociais e à universalização dos direitos sociais”, ressaltando o desafio de considerar como legítima a importância da família como foco objetivo nas políticas públicas.
Nesse momento, retoma- se a discussão sobre a família na perspectiva econômica, sem deixar de considerar sua complexidade social, pois não podemos desconsiderar a necessidade de sobrevivência das famílias.
Lançando mão de dados baseados em autores como Sônia Draibe (1994) que em sua pesquisa conclui que a estimativa dos gastos com essas famílias em projetos voltados ao atendimento de suas necessidades não ultrapassaria 0,5% do PIB nacional (2,14 bilhões de dólares).  
Estes dados evidenciam que os gastos econômicos com o financiamento de projetos de complementação de renda para famílias pobres e indigentes se tornam mais uma questão de decisão política do que propriamente de falta de recursos. Dessa maneira, na Região Norte esse conjunto de ações se torna importante e necessário, pois a diversidade de aspectos sociais e culturais na Amazônia é bastante grande: famílias ribeirinhas, famílias indígenas e egressos de grandes projetos são apenas exemplos que evidenciam a gama de características que podem influir na constituição das famílias amazônidas.
Nesse sentido, a assistência social enquanto política pública necessita abarcar mais informações sobre as famílias na região amazônica com o objetivo de realizar uma ação concreta que atenda às reais expectativas destas famílias, e não os interesses clientelistas e paternalistas ainda fortemente presentes na região.
Assim constituída a assistência social remeteria à construção de propostas substanciadas no conhecimento da realidade das famílias amazônicas, para que estas fossem traduzidas em respostas concretas e objetivas frente às necessidades reais desse segmento populacional, e não em necessidades fictícias e idealizadas pelas práticas e políticas tradicionais na região.

Breve analise do texto.

A partir da apresentação das principais ideias do autor, partiremos para uma breve análise crítica do texto estudo. Diante da fundamentação apresentada pelo professor Maciel podemos tecer a seguinte linha de discussão: A importância de indicadores que orientem a elaboração, construção, organização e implementação das políticas públicas de modo geral.
Entendemos que isso se faz necessário à medida que o autor ao discutir as particularidades da instituição familiar, em especial, no contexto amazônico, nos mostra que a política de assistência social precisa dar atenção e cuidado a esses condicionantes, uma vez, a não observância desses aspectos compromete diversos âmbitos que inclui desde o público-alvo das políticas de seguridade social e todo um processo de construção e implementação das mesmas.
Os indicadores sociais permitem com que no processo de elaboração de uma política pública seja possível construir ações que sejam coerentes com as realidades que posteriormente elas serão aplicadas, permitindo dessa maneira, com que haja impactos mais concretos estabelecendo uma relação de ação- reação na realidade que pretende- se incidir.
A política de assistência social ao eleger a familiar como foco central de seu trabalho precisa fazer um estudo cuidadoso onde torna- se de extrema importância à observação e diagnóstico de aspectos compreendendo a existência da multiplicidade de configurações familiares, constituição territorial, econômica e sociocultural a qual está inserida, contexto histórico entre outras facetas, para que assim seja possível atingir de maneira mais efetiva as famílias que apresentam- se em condições de vulnerabilidades e riscos sociais.



Um comentário