A
adolescência é uma transição desejada e temida, para o terminante mundo dos adultos,
onde o sujeito rompe com sua condição de criança e parte para a etapa do
desprendimento que teve início com seu nascimento. (ABERASTURY; KNOBEL, 1981).
Neste processo de desenvolvimento é onde
ocorrem as confusões, embebidas de questionamentos; os adolescentes apresentam
muitas incertezas sobre como veem o mundo e como querem que o seja.
Estas
transformações referem-se tanto àquelas que são inexoráveis: a passagem da
infância para a adolescência e, posteriormente, idade adulta, como àquelas que
dependem das oportunidades sociais e do acesso aos bens culturais: a
possibilidade de estudar, de cursar uma faculdade, de viajar e de ter acesso a
outras experiências culturais, por exemplo. (BOCH; FURTADO; TEIXEIRA, 2001,
p.269).
De
acordo com o artigo 2° do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990), o adolescente
é o sujeito maior de 12 anos e menor de 18 anos de idade. O adolescente é considerado
pessoa em desenvolvimento, ou seja, tem todos os direitos e necessita de uma
proteção especial, considerada uma prioridade absoluta.
Essa
faixa etária está de acordo com muitos estudos e teorias, clássicos e atuais,
do que comporia a fase do desenvolvimento denominada adolescência (Aberastury,
1981; Erikson, 1976; Tiba, 1993).
No
entanto, embora existam conceitos de que a adolescência seria uma etapa natural
da vida, pela qual todos que compõem essa faixa etária passariam, há também
recentes contribuições da Psicologia que visam à desnaturalização dessa
adolescência.
Discutem
a esse respeito autores como Bock (2007) e Ozella (2003), entre outros
(Menandro, Trindade, & Almeida, 2003; Oliveira & Egry, 1997; Steinberg &
Morris, 2001), refletem criticamente sobre o conceito de adolescência
questionando seu caráter natural e universal. Para então sugerirem a noção de
adolescência construída, em que se considera a realidade social e histórica na
qual cada ser humano está inserido.
No
entanto, embora existam conceitos de que a adolescência seria uma etapa natural
da vida, pela qual todos que compõem essa faixa etária passariam, há também
recentes contribuições da Psicologia que visam à desnaturalização dessa
adolescência.
De acordo com o ECA (1990), o adolescente em
conflito com a lei é definido como aquele
que se encontra na faixa etária que
compõe a adolescência e comete ato infracional. Em outras palavras, Costa
(2006) afirma que um adolescente só pode ser considerado infrator
quando for caracterizado pelos três aspectos a seguir:
a)
violou dispositivos
legais que caracterizavam crime ou contravenção; b) foi-lhe atribuído ou
imputado o cometimento de um ato infracional; c) após o devido processo, com
respeito estrito às garantias, ele foi considerado responsável. (COSTA,
2006, p.16).
Devendo ser apreciado as sanções jurídicas,
mas faz-se é necessário refletir o ato infracional enquanto decorrência de diversos
fatores que resultaram na infração. Seguindo neste sentido que se pode definir
o ato infracional sem pré-conceitos e culpabilização exclusiva do adolescente.
Diversos autores como (Muller, Barboza,
Oliveira, Santos, & Paludo, 2009; Priuli & Moraes, 2007; Rosa, Ribeiro
Junior, & Rangel, 2007), diferenciaram os adolescentes que cometem ato infracional
não de forma a estereotipá-los, e os veem como sujeitos de direito, em suas
pesquisas colhem dados que possam ser úteis e aplicáveis em políticas públicas
direcionadas a esses adolescentes. Vendo a totalidade, os adolescentes em
conflito com a lei, em sua maioria, caracterizaram-se como usuários de drogas,
baixa escolarização, residência em bairros/comunidades de classe baixa, renda
familiar precária, além da ausência de uma rede familiar de apoio, uma vez que
a família também se encontra em situação de vulnerabilidade social (Muller et
al., 2009; Priuli & Moraes, 2007; Rosa et al., 2007).
Com isso observamos que os adolescentes em
conflito com a lei, estudados por esses autores, têm em comum a ausência de proteção
por parte do Estado, da família e da sociedade. Diante de tal contexto, alguns
autores (Espíndula et al., 2006; Espíndula & Santos, 2004; Menin, 2000) implicaram-se
em pesquisar as representações sociais que os adolescentes em conflito com a
lei possuíam acerca de suas condições ou mesmo de como a sociedade os concebe. Por
essa razão, as representações sociais de adolescentes em conflito com a lei são
caracterizadas por termos como perigoso, violento, consequentes de uma
desestrutura familiar. E, por outro lado, as representações sociais que
adolescentes em conflito com a lei possuem sobre suas condições puderam ser demonstradas
pelo trabalho de Menin (2000), que investigou as representações de justiça, lei
e injustiça.
Foi capturado representações relacionadas
aos termos, respectivamente, ocorrência de infrações ou a sanções, ordens
incondicionais e ocorrência de transgressões.
De acordo com os termos acima mencionados,
é importante que sejam considerados também os estudos acerca das medidas
socioeducativas que vão ao encontro das representações sociais de justiça, lei e
injustiça concebidas pelos adolescentes em conflito com a lei no estudo de
Menin (2000).
O ECA
(1990) traz consigo uma abordagem educativa expresso por meio das Medidas
Socioeducativas aplicadas de acordo com o grau da infração cometida pelo
adolescente, e nos casos de maior gravidade podendo ser privado de liberdade.
Elas são classificadas em:
1. Advertência.
2. Obrigação de reparar o dano.
3. Prestação de serviços à comunidade.
4. Liberdade Assistida.
5. Semiliberdade.
6. Internação.
As medidas socioeducativas devem
oportunizar o acesso do adolescente as oportunidades de superação de sua
condição de exclusão, informações no intuito de refletir junto a eles valores
que possibilitem a sua atuação e participação de forma mais crítica na vida
política, econômica e social em que vive, assim como envolver a família e a
comunidade.
A atuação do Estado é essencial via
políticas públicas na promoção destes adolescentes a garantia de seus direitos.
Verifica-se que as políticas sociais vêm
se caracterizando pela pouca efetividade na área social dando um enfoque maior
aos interesses econômicos, deixando bem claro a posição do Estado em garantir
os interesses da classe burguesa.
É importante ressaltar que existe
prioridade, segundo o Sistema Nacional de Atendimento Sócio-Educativo - SINASE
(Secretaria Especial dos Direitos Humanos - SEDH, 2006), às medidas de meio
aberto (prestação de serviço à comunidade e liberdade assistida) em detrimento das
medidas restritivas de liberdade (semiliberdade e internação em estabelecimento
educacional), uma vez que essas medidas garantem o convívio familiar e comunitário
dos adolescentes que a cumprem. Assim, a medida de Liberdade Assistida (L.A.)
compõe uma estratégia inovadora de forma a garantir os direitos desses
adolescentes.
Ainda são poucos os estudos que abordam exclusivamente
a execução da medida de Liberdade Assistida e mesmo as concepções dos
adolescentes que a cumprem (Brito, 2007; Costa & Assis, 2006; Passamani &
Rosa, 2009). Apesar disso, tais estudos descrevem que tal medida possui foco no
adolescente, bem como em sua família, visando à promoção do cumprimento da medida
socioeducativa de maneira que essa não seja tida somente como uma sanção, mas
também que este processo tenha caráter pedagógico, ou seja, que os adolescentes
que a cumprem tenham também a oportunidade de aprender sobre cidadania, mercado
de trabalho, e assim por diante. Idem
Sendo assim é necessário ampliarmos estudos
por meio dos adolescentes em cumprimento de Liberdade Assistida, as
representações sociais de ato infracional e medida socioeducativa. Para isso,
utilizar a Teoria das Representações Sociais, cujo conceito consiste em:
um
modo particular de compreender e de se comunicar, um modo que cria tanto a
realidade como o senso comum. (Moscovici, 2004, p. 49).
Moscovici apoiou-se principalmente em
Durkheim, um dos fundadores da sociologia moderna, que utilizava o termo
“Representações Coletivas”. Durkheim é o primeiro autor a trabalhar
explicitamente o conceito de Representações Sociais, que para ele tinha o mesmo
sentido de Representações Coletivas, sendo que o termo se refere a categorias
de pensamento através das quais determinada sociedade elabora e expressa sua
realidade. (MINAYO, 1995).
Moscovici pensou com Durkheim e contra
ele, dando-se conta de que na sociologia durkheiniana havia o perigo implícito
de esquecer que a força do que é coletivo, entendendo a força concreta da
realidade social, o fato de que ela se apresenta a sujeitos sociais, como um
dado como algo que tem quase a mesma força das pedras que fazem o chão do
mundo, mas abre-se permanentemente para os esforços de sujeitos sociais, que o
desafiam e se necessário o transformam. Idem
Qualificar uma representação de
social equivale a optar pela hipótese de que ela é produzida, engendrada,
coletivamente. A representação contribui ainda, exclusivamente, para os
processos de formação de condutas e de orientação das comunicações sociais.
(MOSCOVICI, 1978, p. 76-77).
A teoria enfatiza não somente a influência
dos contextos sociais sobre os comportamentos que são importantes, mas a
participação desses indivíduos na construção das próprias realidades sociais.
Moscovici, (1978) com o intuito de
afastar-se das perspectivas sociogista para realizar a renovação na teoria das
representações coletivas, se aproximar da psicologia social, mais
especificamente numa perspectiva psicossociológica, pois entendia que esta
permitia penetrar nas representações para descobrir a sua estrutura e os seus
mecanismos internos.
Representações Sociais é um termo
filosófico que significa a reprodução de uma percepção retida na lembrança ou
do conteúdo do pensamento. Nas Ciências Sociais são definidas como categorias
de pensamento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou
questionando-a. Enquanto material de estudo, essas percepções são consideradas
consensualmente importantes, atravessando a história e as mais diferentes
correntes de pensamento sobre o social. (MINAYO, 1995 p. 89).
Para Karl Marx (1984), os homens são
produtores de suas representações, de suas ideias e é a vida que determina a
consciência. A consciência se faz através da linguagem, que nasce da carência,
da necessidade de intercâmbio com outros homens. (MINAYO, 1995).
Gramsci (1981) coloca as Representações
Sociais como uma combinação específica de ideias que povoam o universo de
determinada época e que contêm elementos de tradição e de mudança (MINAYO,
1995).
Em síntese as representações sociais são
imagens construções sobre o real, que se manifestam em palavras, sentimentos e
condutas, tendo como mediador privilegiado a linguagem em razão de serem
coletivas e é somente no coletivo que o ser humano se torna racional, pois
todas as formas de pensamento ou linguagem são sociais; podendo expressar
concepções de mundo como as das ciências, do senso comum e ideologias.
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